Dando continuidade às entrevistas com grandes bonsaístas brasileiros, tenho o prazer de publicar a matéria com o amigo Rock Júnior. Acho que cada bonsaísta pode transmitir um pouco da energia que motiva seu trabalho, falar da sua trajetória e como o bonsai preenche de forma diferente o interior de cada artista. Quando elaborei as perguntas, mais do tentar extrair conhecimento técnico, queria que fosse como um bate papo, como se eles estivessem sentados aqui no meu espaço tomando um chá e fazendo o que acho que todos nós mais gostamos: contar histórias, dividir experiências com amigos e, é claro, fazer bonsai.
1 – Quando você se interessou e começou a se dedicar à arte do bonsai ?
No início da década de 90 vi um bonsai numa floricultura perto da minha casa e isso despertou a minha curiosidade para o assunto. A partir daí, comecei a procurar por bibliografias sobre a arte, a plantar e a garimpar mudas de tudo o que era árvore nativa que eu encontrava. E não parei mais…
2 – Quais espécies você mais gosta de trabalhar ?
Gosto de muitas; entre as nossas nativas posso destacar a jabuticabeira, as caliandras ( Selloi, Spinosa, Depauperata) e o piteceolobium. E entre as exóticas, ficus, acer buergerianun, celtis e prumus são as quais mais me indentifico. Também aprecio e me divirto muito com os junípeurs, pois proporcionam a possibilidade de trabalhar muito com a criatividade.
3 – Que espécie você gostaria de trabalhar na sua região, mas as circustâncias de clima e adaptação não permitem ?
Larix, pinheiro branco japonês e alguns tipos de acer, entre outros.
4 – Dos seus trabalhos, qual você destaca com um carinho especial? Me fale um pouco sobre ele.
Eu posso citar dois trabalhos que mostram nitidamente minha evolução na arte, de forma que as considero, ao mesmo tempo, mestres e colegas de turma.
Primeiramente, este juníperus jacaré. (O segundo trabalho encontra-se no final da entrevista)

No vaso de treinamento, podemos observar a ancoragem que foi feita visando que ela fique na posiçnao desejada.

Mai/06 - Mais de um ano se passou e o procedimento nesse período foi apenas adubar e fazer limpezas freqüentes nos galhos.

A intenção era dar o máximo de vigor para a massa verde com adubações regulares. Costas do junipero.

Antes do procedimento, fez uma nova reestilização dos galhos buscando maior compactação e redução da copa.

conseguindo assim um melhor efeito visual, com maior compactação e proporção entre espessura de tronco e altura.
5 – Você gosta mais de algum estilo de bonsai em particular? Qual?
Eu gosto de todos! Mas o que mais levo em consideração é a naturalidade e a expressão da árvore. Independente do estilo, é fundamental que o bonsai realmente nos remeta a uma árvore muito, muito velha e o mais natural possível, com o mínimo de sinais de trabalho e intervenção humana.
Uma frase do Mestre John Naka ilustra bem o que me refiro: “Faça seu bonsai ficar parecido com uma árvore e não sua árvore parecida com um bonsai.”

O grande mestre John Naka com uma floresta (Yose Ue) de sua autoria na Goshin National Arboretum, Washington DC May 2003
6 – O que a arte do bonsai agregou à sua vida ?
O bonsai acrescentou muito à minha vida. Primeiro por que descobri uma grande paixão e esse sentimento me trilhou por uma caminho maravilhoso dentro da arte.
Além de ter o privilégio de poder estudar e tentar compreender um pouco destas magníficas obras da natureza e do tempo, que são as árvores antigas, ainda posso conhecer pessoas, lugares, culturas diferentes e cultivar verdadeiras e sinceras amizades.
É, sem dúvida alguma, uma caminhada extremamente prazerosa que nos leva a um desenvolvimento emocional e espiritual, alterando até mesmo a nossa percepção do mundo e da natureza.
Também acredito que hoje eu respeite a natureza, as pessoas à minha volta, e a mim mesmo muito mais que antes.
7 – Você acha que um bonsai deve seguir uma ordem rígida de técnica e estética, ou deve seguir uma forma mais livre e artística?
Um excelente pergunta.
As funções das regras são, antes de mais nada, para facilitar a didática e criar um padrão de beleza e avaliação das árvores trabalhadas, como em exposições por exemplo. Se o trabalho consegue expressar beleza, harmonia, força e equilíbrio mesmo sem seguir as regras clássicas, ótimo! Mas…
Podemos fazer um paralelo com o futebol, por exemplo. Imagine que você tenha um time mas queira jogar baseado em regras suas e não as impostas pela FIFA. Você iria jogar sozinho, concorda? Com o bonsai não é diferente e é muito claro. Se você quer fazer bonsai sem se preocupar com as regras não tem problema algum, desde que esteja se divertindo e não tenha pretensões de conseguir prêmios em exposições. Agora, se você deseja participar de exposições ou trabalhar profissionalmente com bonsai, as regras nesse caso são, na minha opinião, imprescindíveis e determinantes.
O Mestre Kimura por exemplo, quebrou as regras quando se destacou no bonsai nas décadas de 70 e 80, mas o fez sendo mais arrojado, trabalhando com uma proporção mais baixa 2 a 3 pra 1, usando o arame da forma que conhecemos hoje em dia e mantendo um excelente nível de apresentação e refinamento das árvores. E o fez depois de estudar durante anos com um mestre da escola tradicional japonesa.
Trabalhos de Bonsai e Penjing por Masahiko Kimura
8 – Que bonsaísta (um ou mais) chama a sua atenção hoje, no cenário mundial?
Não tem como não citar os mestres Masahiro Kimura e Salvatore Liporace, tanto pela expressão de suas obras quanto pelo trabalho didático feito por ambos. Os dois conseguiram acrescentar muito ao desenvolvimento e respeito pela arte nos seus respectivos países de origem.
9 – Que conselhos você poderia dar para quem está começando a se dedicar à arte do bonsai?
Respeite a árvore, antes de mais nada; tenha a preocupação de se informar a respeito de todo o cultivo antes de se aventurar sem experiência. Estudar muito é o melhor e mais acertado caminho. Muita paciência e humildade, pois o tempo é quem lapida o trabalho e, quanto mais aprendemos, mais descobrimos o quanto não sabemos nada.
Mas, na minha opinião, o que realmente importa é se divertir e estar em sintonia com a natureza e com seu interior.
10 – Diga uma frase, um pensamento, que você ache que sintetiza nossa arte.
“O cultivador é médico, pintor, arquiteto, escultor e pai ao mesmo tempo. Você tem de conviver com a planta e proporcionar à ela tudo o que necessita nas quatro estações. Em troca, quando o homem entra em diálogo com o bonsai, atinge um estágio superior, um vazio positivo. É mais que uma terapia. É uma relação de amizade.” (Tomio Yamada)
Todo galho bonito já foi uma gema um dia..
O difícil é ser simples…
Abaixo o trabalho do Rock Júnior com acer palmatum :
Esse acer palmatun eu destaco principalmente pelo tamanho. Sou um apaixonado pelas pequenas, não sei se pelo desafio do cultivo e formação, ou pela dificuldade de se conseguir a simplicidade e a beleza em tão pouco volume.

(Out/03) Início do trabalho de estilização. Para a definição da frente do Bonsai, foi feita uma análise cautelosa de todos os ângulos da muda.

O fator determinante foi o Nebari, que visto em detalhe, percebe-se o seu potencial que deveria ser realçado.

Escolhida a frente, foi feita a 1ª poda, drástica. O transplante foi feito no mesmo dia pelo gde volume de massa verde podado.

(Out/05) 2 anos após o início do trabalho já com o nebari em evidência e a estrutura de galhos bem definida.

Para que a copa ficasse bem compacta, eram regulares desfolhas e podas nas pontas da brotação. Observe também a adubação.

Aqui pode-se observar a nova estrutura, o posicionamento dos galhos e a cicatriz da poda brusca bem evoluída. (fundo planta)

(Jan/06) No verão foi feita nova desfolha para melhorar a ramificação e diminuir o tamanho das folhas. (frente planta)